terça-feira, 2 de dezembro de 2008

O Enterro

* Esse texto é fruto de uma atividade em grupo, na qual cada componente deveria contar uma história e depois o grupo escolheria uma delas para ser compartilhada com toda a turma e registrada para posteriormente compor este blog.


Numa cidade de interior do Estado do Rio de Janeiro morava Izabel. Menina curiosa e muito esperta, tinha um grande desejo: participar de um enterro. Quando estava com 7 anos, aconteceu o que ela esperava há tanto tempo. Um enterro à vista!!! Infelizmente foi de alguém que ela amava muito: Tia Candinha.

Tudo começou com Tia Candinha saindo da casa de Izabel, onde também morava, para visitar os lugares que ela nunca tinha ido naquela cidade e que tanto desejava conhecer. Ela raramente saía de casa, e sem que ninguém pudesse imaginar, aquele seria um dia muito especial. Foi à usina, passeou pelos campos, andou de trem, e ao final da tarde chegou bastante cansada em casa, mas com um sorriso no rosto que demonstrava sua imensa felicidade por realizar seu sonho.
Foi tomar um banho e enquanto isso, a mãe de Izabel preparou um chá para essa Tia tão querida. Quando ficou pronto, Izabel foi ao quarto a pedido da mãe e bateu na porta. Bateu de novo. Mais forte. O coração da menina começou a acelerar. Algo estava errado. Muito errado. Será que aconteceu alguma coisa? - pensava a menina. Será que Tia Candinha morreu? Essa era a intuição daquela criança.
Izabel foi procurar a mãe, que se encontrava em outro banheiro da casa, tomando banho também.
Ô mãe, Tia Candinha não responde!!!
O quê?
Já bati várias vezes e ela não responde!!!
Você bateu forte?
Sim, mamãe. Vai lá, vai!!!
A mãe, apressada, sai do banheiro. Preocupada, se aproxima do quarto, bate na porta, espanca a porta, arromba a porta e encontra Tia Candinha desfalecida; na realidade, falecida. Que tristeza!!! Que horror!!!
Mais tarde, depois de tudo arrumado, os vizinhos começaram a chegar para o velório que aconteceria, como de costume da época, na própria casa do falecido, no caso, da falecida. Izabel observava tudo. Ela estava radiante porque finalmente participaria de um enterro, mas muito, muito triste porque perdera a amada Tia Candinha.
No outro dia, todos estavam preparados para o enterro. Eles precisariam levar o corpo para o cemitério que ficava um pouco distante da residência da família de Tia Candinha. Para isso, precisariam pegar um trem, daí a grande curiosidade de Izabel em participar de um enterro: “o que será que se fazia no trem durante a viagem para o cemitério?”.
Mas, nesse exato momento, algo que Izabel não previa aconteceu. Na estação de trem, a sua mãe a informou que, como ela era muito nova, e para não sofrer mais, não participaria daquela fúnebre viagem. Mas, como não? - pensou Izabel. É tudo que eu mais quero!!! - continuou ela envolta em seus pensamentos.
O trem partiria em instantes. Izabel percebeu que sua mãe estava tão, mas tão triste, que não conseguia ter o controle total da situação. Foi nesse momento que ela decidiu: “eu vou”. Pulou para dentro do trem, e se escondeu num cantinho de um dos vagões, distante da mãe, e acompanhou aquele cortejo até a outra estação, e depois ao cemitério.
Tudo estava tranqüilo até o instante que o avô de Izabel a viu e perguntou o que estava fazendo ali. “Sua mãe está preocupada porque te deixou em casa sozinha e você está aqui, menina?!” - disse ele. Deu um sorriso bastante consolador, e esse foi um sinal de que a reprovação por aquela desobediência não era lá tão reprovadora assim.
Izabel decidiu que não deveria ficar mais. Já tinha visto o bastante. Iria voltar para casa antes que os outros, principalmente sua mãe, percebessem que ela esteve todo o tempo no cortejo fúnebre. Mas o trem já havia partido. O que fazer? Voltar correndo, era o jeito. Como não era tão longe assim, a menina começou a correr pelos trilhos do trem. Era a garantia de que não se perderia.
Correu, correu, correu muito, e, de repente, parou. Como podia ter esquecido daquilo!!! “Ai, meu Deus, e agora? Volto ou sigo em frente?” - pensou ela. Diante de Izabel estava um pequeno rio, e os trilhos ficavam “soltos” no ar, e a distância entre os dormentes era considerável. Em sua cabeça, só o trem conseguia ultrapassar esse obstáculo, mas voltar agora era decepcionar grandemente sua mãe por conta da desobediência. Era preciso vencer o medo. E venceu. Calculou a distância entre os dormentes, fechou os olhos e foi. Ufa!!! Passou!!! Conseguiu. Chegar em casa agora seria questão de tempo, e bem pouco tempo.
Mais tarde, quando todos retornaram do enterro, a mãe começou a explicar para Izabel o que tinha acontecido desde a estação do trem até o cemitério. A menina fingia uma curiosidade tamanha, mas não teve coragem de falar que vira tudo aquilo ao vivo e a cores. A verdade só foi dita algumas semanas depois, e ela nem apanhou por isso. O importante mesmo é que sua mãe ficou sabendo de tudo, e o grande sonho de Izabel fora realizado. Ela participou de um enterro!!! Tudo bem que não ficou até o final, mas ela sabia que teria outras oportunidades, e essa aventura nunca, jamais foi esquecida, assim como Tia Candinha também não.


* Essa história foi baseada em relatos reais da infância da aluna Izabel, escrita por Marilucia Corel.

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